Revista Ação Ergonômica
https://revistaacaoergonomica.org/article/doi/10.4322/rae.v16e202212
Revista Ação Ergonômica
Artigo de Pesquisa

A Colheita Manual de Tomate: Entre a Prescrição e os Saberes Tácitos  

THE MANUAL HARVEST OF TOMATOES: BETWEEN PRESCRIPTION AND TACIT KNOWLEDGE

Fabiana Raulino da Silva, Andréa Regina Martins Fontes, Uiara Bandineli Montedo, Marina Helena Pereira Vieira, Renato Luvizoto Rodrigues de Souza

Downloads: 2
Views: 560

Resumo

A competência dos trabalhadores que realizam a colheita manual do tomate está intrinsecamente relacionada à cooperação e aos conhecimentos adquiridos na prática. O objetivo desse artigo é analisar a contribuição dos saberes tácitos dos colhedores de tomate na elaboração de estratégias de escolha dos frutos a serem colhidos. Baseado nos pressupostos da Ergonomia da Atividade foi conduzido um estudo de caso em três propriedades agrícolas no interior do estado de São Paulo, Brasil, utilizando como ferramentas as observações livres, entrevistas com roteiro semiestruturado e análise dos discursos dos trabalhadores da colheita manual do tomate. Os resultados mostram que os trabalhadores constroem um mapa mental como uma referência do que é um fruto adequado para ser colhido, formado a partir de diversas informações multissensoriais. O trabalhador classifica e selecione tacitamente o fruto de acordo com a qualidade prescrita em protocolos, mesmo sem terem recebido um treinamento formal. Portanto, embora tido como um trabalho braçal, esse estudo mostra a complexidade dos saberes mobilizados na colheita e a importância de se entender esse processo para a compreensão do trabalho real.

Palavras-chave

Ergonomia da Atividade; Cultivo Agrícola; Conhecimento Tácito; Tomate.

Abstract

The competence of workers engaged in manual tomato harvesting is intrinsically related to the cooperation and the knowledge acquired in practice. The aim of this paper is to analyze the contribution of the tacit knowledges of workers involved in tomato harvesting in the elaboration of strategies that guide the choice of the fruits to be harvested. Based on the Activity-centered. Ergonomics concepts, a case study was conducted on three farms in the interior of the state of São Paulo, Brazil, using as tools: free observations, interview with semi-structured script and analysis to the verbalizations of manual tomato harvest workers. The results show that the workers construct a mental map as a reference of what is a suitable fruit to be harvested, formed from several multisensory information. The worker classifies and tacitly selects the fruit according to the quality prescribed in protocols, even without having received formal training. Therefore, although considered as a legwork, this study shows the complexity of the knowledge mobilized in the harvest and the importance of understanding this process to better understand the real work. 

Translated version DOI: https://doi.org/10.4322/rae.v16e202212.en

Keywords

Activity-centered Ergonomics; Agriculture Cultive; Tacit Knowledge; Tomato.

Referências

ABRAHÃO, R. F. (2003). A contribuição da ergonomia para o trabalho agrícola. In: Workshop Tomate na UNICAMP: Perspectivas e Pesquisas. Campinas: FEAGRI/UNICAMP
BINOTTO, E., NAKAYAMA, M. K., & SIQUEIRA E. S. (2013). A criação de conhecimento para a gestão de propriedades rurais no Brasil e na Austrália. Revista de Economia e Sociologia Rural, 51(4),681–698. http://dx.doi.org/10.1590/S0103-20032013000400004
BRAGA, C. O. (2007). Análise ergonômica do trabalho e exigências laborais em unidades de beneficiamento de tomate de mesa (Dissertação de mestrado). Universidade Estadual de Campinas, Campinas.
BONFATTI. R, MOTTA, D., & VIDAL, M.C. (2003). Os limites da análise ergonômica do trabalho centrada na identificação de riscos biomecânicos. Ação Ergonômica. 1(4), 63-77. Recuperado em 20 de julho de 2020, de: http://www.abergo.org.br/revista/index.php/ae/article/view/36/33
BRAUNBECK, O. A., & OLIVEIRA, J. T. A. (2006). Colheita de cana-de-açúcar com auxílio mecânico. Engenharia Agrícola. 26(1), 300–308. https://doi.org/10.1590/S0100-69162006000100032
CAMARGO FILHO, W. P., DONADELLI, A., SUEYOSHI, M. L. S., & DE CAMARGO, A. M. M. P. (1994). Evolução da produção de tomate no Brasil. Agricultura em São Paulo, 41(1), 41–69. Recuperado em 01 de agosto de 2020, de http://www.iea.sp.gov.br/ftpiea/ASP4-0194.pdf
CARDOSO, S. C., SOARES, A. C. F., BRITO, A. S., CARVALHO, L. A., PEIXOTO, C. C., PEREIRA, M. E. C., & GOES, C.  (2006). Qualidade de frutos de tomateiro com e sem enxertia. Bragantia, 65(2), 269–274. Recuperado em 20 de julho de 2020, de https://doi.org/10.1590/S0006-87052006000200008
CHATIGNY, C. (2000). The conditions for apprenticeship in a work situation: margins of maneuver and resources to be changed by the individual, the group and the organization. Proceedings of the Human Factors and Ergonomics Society Annual Meeting, 44 (12), 2-705-2-708. https://doi.org/10.1177/154193120004401272
COMPANHIA DE ENTREPOSTOS E ARMAZÉNS GERAIS DE SÃO PAULO (CEAGESP), Programa Brasileiro para Modernização da Horticultura, Centro de Qualidade em Horticultura. (2000). Normas de Classificação do Tomate. São Paulo: CEAGESP. Recuperado em: 10 de agosto de 2020, de http://www.ceagesp.gov.br/wp-content/uploads/2015/07/tomate.pdf
DANIELLOU, F. (2004). Questões epistemológicas acerca da Ergonomia. In: F. Daniellou (coord.) A ergonomia em Busca de seus princípios: debates epistemológicos (1st ed.), 1-18. São Paulo: Edgard Blücher.
DANIELLOU, F., & BÉGUIN, P. (2007). Metodologia da ação ergonômica. In: FALZON, P. Ergonomia. São Paulo: Edgard Blücher, p. 281-301.
DE BIASE, L. (2007). A condição feminina na agricultura e a viabilidade da agroecologia. Revista Agrária, São Paulo, (7), 4-36. https://doi.org/10.11606/issn.1808-1150.v0i7p4-36
DUARTE DUARTE, J. (2003). Ambientes de Aprendizaje: Una aproximación conceptual. Revista Iberoamericana De Educación, 33(1), 1-18. https://doi.org/10.35362/rie3312961
FALZON, P. (2007). Ergonomia (1st ed.). São Paulo: Edgard Blücher.
FATHALLAH, F. A. (2010). Musculoskeletal disorders in labor-intensive agriculture. Applied Ergonomics, 41(6), 738–743. https://doi.org/10.1016/j.apergo.2010.03.003
FARIA, F. F., & OLIVEIRA, J. T. A. (2005). Matriz de coeficientes técnicos da cultura do tomate de mesa: base para cálculo dos custos de produção e colheita. In: XIII Congresso Interno de Iniciação Científica da Unicamp. Campinas: FEAGRI/UNICAMP.
FERREIRA, S. M. R., DE FREITAS, R. J. S., & LAZZARI, E. N. (2004). Padrão de identidade e qualidade do tomate (Lycopersicon esculentum Mill.) de mesa. Ciência Rural, 34(1), 329–335. https://doi.org/10.1590/S0103-84782004000100054
FERREIRA, M. C. (2000). Atividade, categoria central na conceituação de trabalho em ergonomia. Revista Alethéia, 1(11), 71–82. Recuperado em 16 de junho de 2020, de: http://www.ergopublic.com.br/arquivos/1252856337.07-arquivo.PDF
FRANK, A. L., MCKNIGHT, R., KIRKHORN, S. R., & GUNDERSON, P. (2004). Issues of Agricultural Safety and Health. Annual Review of Public Health, 25, 225-245. https://doi.org/10.1146/annurev.publhealth.25.101802.123007
GUÉRIN, F., LAVILLE, A., DANIELLOU, F., DURAFFOURG, J., & KERGUELEN, A. (2001). Compreender o trabalho para transformá-lo: a prática da Ergonomia (1st ed.). São Paulo: Edgard Blücher.
GUIMARÃES, M. C. (2002). O clima organizacional na empresa rural: um estudo de caso na Fazenda Pontal Unaí/MG (Dissertação de mestrado). Faculdade Cenecista de Varginha, Varginha.
IIDA, I., & BUARQUE, L. (2016). Ergonomia: projeto e produção (3rd ed. revista). São Paulo: Edgard Blücher.
INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA (IBGE). (2014). Levantamento Sistemático da Produção Agrícola LSPA. Recuperado em 20 de março de 2020, https://www.ibge.gov.br/estatisticas-novoportal/economicas/agricultura-e-pecuaria/9201-levantamento-sistematico-da-producao-agricola.html?&t=downloads
JAFRY, T., & O’NEILL, D. H. (2000). The application of ergonomics in rural development: a review. Applied Ergonomics, 31 (3), 263-268. https://doi.org/10.1016/s0003-6870(99)00051-4
LEMOS, B., & JOIA, L. A. (2012). Relevant factors for tacit knowledge transfer within organizations: an exploratory study. Gestão & Produção, 19(2), 233–246. https://doi.org/10.1590/S0104-530X2012000200001
LOURENZANI, A. E. B. S., & DA SILVA, A. L. (2004). Um estudo da competitividade dos diferentes canais de distribuição de hortaliças. Gestão & Produção, 11(3), 385–398. https://doi.org/10.1590/S0104-530X2004000300011
MANZ, L. N., & SILVER, K. (2013). Tomato worker ergonomics: REBA panel evaluation of job tasks using video. Undergraduate Honors. Thesis Series. Paper 116. Recuperado em 13 de dezembro de 2019, de http://dc.etsu.edu/honors/116
MONTEDO, U. B. (2012). The process of constructing new competencies in the family agricultural production unit. Work, 41(Suppl.1), 76–80. https://doi.org/10.3233/WOR-2012-0138-76
MONTEDO, U. B., & ABRAHÃO, J. I. (2015). The process of developing new competences: a case study at a family agricultural production unit. Production, 25 (2), 336–343. http://dx.doi.org/10.1590/0103-6513.145113
MONTEDO, U. B., & SZNELWAR, L. I. (2008). Análise ergonômica do trabalho agrícola familiar na produção de leite. Production, 18 (1), 142-154. http://dx.doi.org/10.1590/S0103-65132008000100011
MYERS, R. J. (1997). Injuries among farm workers in the United States, 1993. Cincinnati (OH): National Institute of Occupational Safety and Health (US). Recuperado em 12 de outubro de 2019, de https://www.cdc.gov/niosh/docs/97-115/pdfs/97-115.pdf?id=10.26616/NIOSHPUB97115
OUELLET, S., & VÉZINA, N. (2014). Work training and MSDs prevention: Contribution of ergonomics. International Journal of Industrial Ergonomics, 44(1), 24–31. https://doi.org/10.1016/j.ergon.2013.08.008
POLANYI, M. (1996). The Tacit Dimension. (1st ed.) London: Routledge.
RIBEIRO, I. A. V., TERESO, M. J. A., & ABRAHÃO, R. F. (2009). Análise ergonômica do trabalho em unidades de beneficiamento de tomates de mesa: movimentação manual de cargas. Ciência Rural, 39 (4), 1073–1079. https://doi.org/10.1590/S0103-84782009005000037
RODRIGUES, L. R., ZAMBON, F. R. A., & MURARO, D. (2010). Classificação do tomate por atacadistas e produtores Curitiba. Horticultura Brasileira, 25(4), 521–526. https://doi.org/10.1590/S0102-05362007000400006
SANTOS, A. P. S., YAMAGUCHI, C. H., VIEIRA, A. C. P., & WATANABE, M. (2016). Agricultural diversification and management of tacit knowledge in rural properties Brazil. Espacios, 37(22). Recuperado em 20 de dezembro de 2019, de http://www.revistaespacios.com/a16v37n22/16372204.html 
SANTOS, A. S., & CURADO, F. F. (2012). Perspectivas para pesquisa agroecológica: diálogo de saberes. Aracaju: Embrapa Tabuleiros Costeiros. Recuperado em 10 de janeiro de 2020, de http://www.cpatc.embrapa.br/publicacoes_2012/doc_172.pdf
GEOFFREY, S. K., HILLARY, N. K., ANTONY, K. M., MARIAM, M., & MARY, M. C. (2014). Challenges and Strategies to Improve Tomato Competitiveness along the Tomato Value Chain in Kenya. International Journal of Business and Management, 9(9), 205–212. https://doi.org/10.5539/ijbm.v9n9p205
GREGOLIS, T. B. L., PINTO, W J., & PERES, F. (2012). Percepção de riscos do uso de agrotóxicos por trabalhadores da agricultura familiar do município de Rio Branco, AC. Revista Brasileira de Saúde Ocupacional, 37(125), 99–13. https://doi.org/10.1590/S0303-76572012000100013
SILVA, F. R. D. (2015). Saberes tácitos na colheita manual do tomate: estudo de caso a partir da perspectiva da ergonomia. (Dissertação de mestrado). Universidade Federal de São Carlos, Sorocaba.
SILVER, K., HOFFMAN, K., LOURY, S., FETHKE, N. B., LIEBMAN, A., MANZ, N. MANOCK, S., ANDINO, A., BRADFIELD, M., MORRISSETTE, D., & FLORENCE, J. (2014). A campus-community partnership for farmworkers' health: an intervention for tomato workers in Tennessee. Prog Community Health Partnersh, 8(4), 501–510. https://doi.org/10.1353/cpr.2014.0056
TABOSA, F. J., FERREIRA, R. T., & CASTELAR, L. I. (2014). Convergência de mercados intrarregionais: o caso do mercado atacadista brasileiro do tomate. Revista de Economia e Sociologia Rural, 52(1), 61–80. https://doi.org/10.1590/S0103-20032014000100004
TESSARI, C. A. (2014). Trabalhadores temporários para o café: mecanização e núcleos coloniais em São Paulo, 1895-1911. Estudos Econômicos (São Paulo), 44(2), 409–434. https://doi.org/10.1590/S0101-41612014000200007
TILLMANN, A. M. A. (1994). Organização do trabalho e saúde: estudo comparativo com operários rurais de uma empresa de pesquisa agropecuária (Dissertação de mestrado). Universidade de Brasília, Brasília.
ULBRICHT, L. (2003). Fatores de risco associados à incidência de DORT entre ordenhadores em Santa Catarina (Dissertação de mestrado). Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis.
VASCONCELOS, R. C., LIMA, F. de P. A., CAMAROTTO, J. A., ABREU, A. C. M. da S., & COUTINHO FILHO, A. O. S. (2008). Aspectos de complexidade do trabalho de coletores de lixo domiciliar: a gestão da variabilidade do trabalho na rua. Gestão & Produção, 15(2), 407–419. http://dx.doi.org/10.1590/S0104-530X2008000200015
WISNER, A. (1987). Por dentro do trabalho: ergonomia: métodos e técnicas (1st ed.). São Paulo: FTD.
YIN, R. K. (2015). Estudo de caso: planejamento e métodos (5.ed.). Porto Alegre: Bookman.

 

63bdb25da95395364655f8c6 abergo Articles
Links & Downloads

R. Ação Ergon.

Share this page
Page Sections